Cap. Rui Coelho Abrantes à frente do Esq. 149 formado em apresentar armas na parada do hastear da bandeira portuguesa em Zala.
CARTA ENVIADA À LIGA DOS COMBATENTES ACERCA DO TEXTO "CONQUISTA DE NAMBUANGONGO" UMA "ESTORIA" DA AUTORIA DO FURRIEL EDGAR SILVA PUBLICADA NA REVISTA DA LIGA DE DEZEMBRO DE 2012
Exmos. Senhores,
Caros Combatentes.
Um camarada meu do Esq. Cav. 149 chamou-me a atenção para a
“Estória” contada e inscrita na Vossa Revista de Dezembro de 2012 com o heróico
titulo de “Conquista de Nambuangongo”, da autoria de Edgar Silva.
É certo que o autor lhe chama “estória” pelo que nos informa
à partida que vai contar uma ficção. Contudo o assunto histórico mesmo ficcionado tem
de sustentar-se na realidade dos factos históricos e não em deturpações
grosseiras desses factos. Não é, contudo, o que o autor faz que mais parece escrever para se auto-elogiar
permanentemente ao longo do texto e divertir-se com a guerra invocando-a para
se exibir quase à maneira de António Lobo Antunes.
O autor Furriel sem medo, começa logo no titulo por insinuar
que esteve na “Conquista de Nambuangongo” mas, lendo o texto, constata-se que fez
o percurso até Zala e esteve aqui acampado. Depois apenas informa que parte com
a sua Unidade, penso que o Batalhão 158, para algures próximo de Carmona. Pelo
menos não dos diz nada como, quando e com quem chegou a Nambuangongo, que
distava ainda 44 Kms, nem refira quem lá estava quando lá chegou dado que, como
é historicamente sabido, o Bat. 96 do Coronel Maçanita foi a primeira Unidade
militar a entrar em Nambuangongo e lá permaneceu largos dias. O autor omite
deliberadamente a sua chegada e como a Nambuangongo para evitar maior confronto
com a realidade que sabe ser outra e contrária ao efeito que pretende tirar da
sua “estória”.
É do conhecimento geral militar e histórico da guerra que na
operação “Viriato”, relativa ao objectivo bem definido da tomada de
Nambuangongo, tomaram parte 3 colunas militares por eixos diferentes: O Bat.
96, o Bat. 114 e o Esq. 149, este exactamente pelo eixo
Ambriz-Zala-Nambuangongo. O Bat. 96 atingiu Nambuangongo às 17,00 horas de
9Ago61 e o Esq. 149 às 9,00 horas de 10Ago61. Mais nenhuma outra Unidade foi
encarregada ou tomou directamente parte na tomada de Nambuangongo. O Comandante
do Bat. 158, certamente, nunca podia ter informado os seus homens que a missão do
seu Bat. era a tomada de Zala e Nambuangongo, como afirma Edgar Silva no seu
texto.
Mas o nosso Furriel conquistador sem medo, deturpa a
realidade dos factos, também, quando afirma que a sua Unidade desobstruiu e
tomou as povoações até Zala e conquistou esta povoação, importante sede de
Posto Administrativo. Quem foi primeiro e travou todas as batalhas e tomou
todas as povoações até Zala, incluindo esta e depois até Nambuangongo foi o
Esq.149 que, esse sim, tinha a missão de desobstruir o caminho e retomar
povoações até ao objectivo final, que era tomar e ocupar Nambuangongo.
No terreno a missão
do Bat.158 consistiu em ocupar as povoações tomadas pelo Esq.149 no seu
percurso como Quimbumbe e depois Zala onde tropas do Bat. 158 ficaram
instaladas para guarda dessas posições recuperadas e aí permaneceram depois do arranque
do Esq. 149 para Nambuangongo pelas 18,00 horas do dia 8Ago61. Na véspera, dia
7Ago61 foi o Esq. 149 que formou em parada para hastear a bandeira portuguesa no
Posto de Zala após a qual o Comandante do
Esq. 149, Cap. Rui Coelho Abrantes fez a entrega oficial da povoação à entidade
administrativa competente, o Chefe de Posto de Zala.
Em Zala, na hora da partida para Nambuangongo, o Esq. 149
recebeu como reforço dois pelotões do Bat. 158 onde, eventualmente, estaria
incluído Edgar Silva o que, nesse caso, dará um mínimo de verosimilhança à sua
“estória”. Não é, contudo, sério, afirmar que a sua Unidade foi encarregada da
missão de conquistar Nambuangongo e pelo caminho conquistou Zala e outras
povoações, feito esse que apenas pertence ao Esq. 149. Igualmente, não é sério que,
caso seja verdade que tenha chegado a Nambuangongo incluído como reforço e sob
o comando do Esq.149, não só omita esse facto como insinue ser seu conquistador,
feito que nem sequer coube ao Esq. 149 mas sim, como é conhecido, ao Bat. 96. Como
reforço e Adidos ao Esq. 149 haviam Pelotões de Morteiros 81, de Artilharia com
peças 88, de Sapadores da Compª. Engª. 123 e dos Dragões de Luanda equipados
com blindados Panhard e nenhum seu elemento ousou ainda reivindicar para si, ou
sua Unidade de origem, a conquista de Zala ou Nambuangongo. Publicar um texto
com o título “Conquista de Nambuangongo” e depois falar apenas de si próprio
atribuindo-se conquistas e feitos alheios, é de uma vaidade insuportável.
Deixa-nos espantados que a Liga, que pretende ser um
repositório fiel dos acontecimentos dos Exércitos portugueses nas várias
guerras e especialmente na controversa Guerra Colonial, não tenha alguém
conhecedor e competente para supervisionar os textos publicados nos seus
documentos que a representam oficialmente.
Acho eu que, a Liga deve confirmar a veracidade dos
acontecimentos relatados e impressos em documentos que só a si responsabilizam.
Caso contrário, a História da Guerra feita pelos futuros historiadores com base
em documentos sem rigor, acabará por ser uma História de dúvidas e logro: com
relatos deturpados e falsos dos factos haverá amanhã Histórias da Guerra para
todos os gostos e feitios. Como a “estória” pouco séria por vós publicada e aqui
criticada, são hoje mato nos nossos media, onde cada um conta a sua “estória”
da maneira mais conveniente e fácil para conseguir um auto-elogio sem a hombridade
de respeitar a verdade dos factos.
E não seria difícil repor os factos da guerra tal como
aconteceram dado que a maior parte dos participantes nela ainda são vivos e
podem relatá-los de viva voz. Espanta-me que os Comandantes das operações de
envergadura ou outras significativas, jamais tenham sido convidadas a depor. Ao
contrário são sempre os jornalistas ou “estudiosos” que vão debater a Guerra
sob uma perspectiva e interpretação literária ou psicológica que não tem nada a
ver com os factos reais vividos pelos próprios. O Artur Agostinho,
provavelmente ainda tremendo de medo, até comentou a Guerra e sobretudo a
Batalha de Nambuangongo sob a perspectiva futebolística: avistou-a do alto dum
avião e, claro, não ouviu tiros nem viu mortos e feridos e, claro também, viu nela
o que era seu hábito e especialidade, um jogo de futebol envolvido de clubite.
Por outro lado, penso, que a Liga tem relatos e documentos
escritos e de imagem, fieis e credíveis, suficientes para poder fazer a análise
histórica correcta sobre as “estórias” que alguém queira contar e mais não são
que ficções auto-apologéticas.
Para constatação da verdade dos factos que acima referimos,
pode a Liga consultar os seguintes documentos:
- Filme “A Grande Arrancada” da autoria dos repórteres da
RTP Neves de Sousa e Serras Fernandes que acompanharam, filmaram e viveram com
o Esq. 149 até Nambuangongo.
- O livro “História do Esquadrão de Cavalaria 149” da
autoria do nosso Tenente Médico Dr. João Alves Pimenta, escrito durante a
campanha e impresso ainda em Luanda em 1963.
- O livro “Esquadrão 149 – A Guerra e os Dias” da autoria de
José Neves, Furriel do Esq. que relata os factos tal como os viveu e não por
ouvir dizer.
Os nossos respeitosos cumprimentos,
Adolfo Contreiras
Furriel do Esq. 149
Gorjões, 24.01.2013
PS – Informamos que iremos publicar esta carta no blogue
“Memória 149” que pretende relatar o percurso, missões e feitos do Esq. 149 em
Angola entre 1961 – 1963 e que, precisamente, nesta altura está relatando a
tomada de Zala.
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