O MOURARIA SENDO ENTREVISTADO PELO REPÓRTER DA RTP NEVES DA COSTA
O Mouraria tinha este nome de baptismo militar devido ao bairro lisboeta de sua naturalidade. Mas também esse baptismo não era indiferente ao seu comportamento e falas característicos desse bairro genuinamente típico de Lisboa. A sua atitude e reacção perante a guerra estavam-lhe moldados na alma pela sua pertença humana ao bairro onde mourejara desde criança a adulto.
Passar de repente a ser militar apenas lhe introduziu obrigações que cumpria por imposição mas jamais por qualquer compreensão de ordem ou disciplina. O seu comportamento militar, ainda para mais o rígido comportamento militar cavaleiro, era nada para a sua inocência de garoto criado à solta nas ruas cheias de gente viva e atitude fadista.
MOURARIA A RECEBER TRATAMENTO MÉDICO DO DR. JOÃO PIMENTA EM PLENA PICADA
Dos cinco feridos ligeiros que tivemos durante a batalha de Zala um deles foi o Mouraria. O inimigo atacou com uma canhangulada sobre o jipão onde ia o Mouraria e feriu-o na boca e nariz e outros nas mãos e pernas contudo sem gravidade. O disparo fora feito de longe para o alcance daquela arma artesanal e os estilhaços de ferro, que no canhangulo substituiam as nossas balas, tiveram um impacto superficial.
O DR. JOÃO PIMENTA A SER ENTREVISTADO APÓS RECOMPOR O NARIZ DO MOURARIA
Foi precisamente no arranque de Quimazangue para Zala que ao Mouraria lhe veio à mente as suas memórias de garoto pendurado nos eléctricos entre a Mouraria e o Chile. Quando a longa coluna de viaturas estava alinhada na picada para arrancar e o Comandante Abrantes deu ordem de marcha, o Mouraria desata a gritar sem parar, "segue, segue vai pró Chile" enquanto imitava o cobrador do eléctrico no gesto de puxar pelo cordão que fazia tocar campainha de arranque.
Tal grito e gesto aplicado no momento certo e instantaneamente adoptado e replicado em todas as viaturas ecoou um a um até à viatura da frente da coluna, e esta lançou o grito e o gesto para a rectaguarda enquanto arrancava lentamente.
Desde esse momento feliz nunca mais o Esquadrão, em qualquer operação, grande ou pequena, montada ou apeada, deixou de usar a voz de arranque "segue, segue vai pró Chile".
Este grito e gesto, usados sempre em todas as abaladas do aquartelamento ou cada vez que a coluna arrancava ou partia durante as operações, foi imediatamente adoptado pelo Comando e tornou-se uma voz de comando e um símbolo do Esquadrão que, como outros, o distinguiam.
O som musical do "segue, segue vai pró Chile" aliado do gesto do puxar do cordão e o imitar do tocar da campainha, sugeria uma minúscula peça teatral que nos entusiasmava e dava alma para, na hora de ir ao encontro do inimigo nos esquecermos dele, e no momento do enfrentar ter mais força e ânimo de o combater.
E tudo isto, que não foi pouca coisa, graças ao garoto reguila fadista que habitava no corpo de Soldado do Mouraria.
CAMINHADA APEADA EM DIRECÇÃO A ZALA
............................................................................................................Lá vai o eléctrico às voltas
Segue chiando no seu carril
Leva um menino às costas
Segue, segue vai p'ro Chile
E o eléctico chia e rola, rola
Com o menino pendurado
Vai pró Chile, e não prá escola
E o menino foi p'ra Soldado
E o Soldado menino foi prá guerra
Com arma, balas, capacete, cantil
E o menino que o Soldado encerra
gritou, "segue, segue vai pró Chile"
Ó Soldado reguila, puto rufia
Do bairro pobre, tua moldura,
Que te legou nome "Mouraria"
E tu a nós um poema em Figura.
José Neves
Lisboa, 1997
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Bom dia.
ResponderEliminarSou um familiar do Soldado Manuel Reis Ferreira, que serviu no Batalhão 149 que na operação Viriato rumou a Nabungongo. Alguém se lembra dele?
Era condutor de um carro de combate.
Gostaria de servir de ponte entre o que com ele serviram e ele, uma vez que já se encontra algo debilitado.
Abraço do sobrinho desse Camarada dos Dragões de Angola.
Caro José Lopes,
ResponderEliminarO seu tio, pelo que relata, fez parte do Pelotão dos Dragões de Luanda que sob o Comando do então Alferes Barão da Cunha esteve adido ao Esq.149 e combateu ao nosso lado desde Ambriz a Nambuangongo durante 16 dias sob perigo constante de vida ou morte.
Em 2011 fizemos a nossa confraternização anual em Lanceiros 2, na Ajuda, Lx. e esteve connosco o coronel Barão da Cunha e vários militares desse heróico Pelotão dos Dragões do qual o seu tio foi, pelo que diz, condutor de Panhard.
Penso que, se pesquisar na net "barãodacunha" encontrará algum sítio onde possa dialogar com o Coronel Barão da Cunha, então Alferes, pois é ele com o seu pessoal desse célebre Pelotão que organizam as suas confraternizações habituais.
Cumprimentos e um abraço para o seu tio.