domingo, 24 de maio de 2020

AVELINO JOSÉ LEITÃO: DE SOLDADO RASO A CAPITÃO



SARGENTO LEITÃO

 2º SARGENTO LEITÃO MILITAR


Do perfil militar feito pelo próprio de forma simples, concisa e sumária ressalta notoriamente o orgulho do Nosso 2º. Sargento Leitão na sua carreira de Soldado Recruta até Capitão e sobretudo pelo facto de ter pertencido ao Nosso Esquadrão de Cavª. Nº. 149.
Ele faz menção de destacar que a mais rica e forte experiência militar de que tem uma Memória inesquecível é precisamente a sua passagem pelo Esq.149 que, para ele tal como para todos nós foi, para além de uma guerra militar de vida ou morte com balas a sério foi também uma Escola de formação militar segundo o melhor código e regras de conduta humana sob guerra quer para Soldados de carreira quer, inclusive e especialmente, uma importante Escola de formação cívica e ética para os Soldados aldeões simples obrigados à guerra sem apelo.
Realmente, e como nos disse um dia o Dr. João Alves Pimenta nosso médico do Esquadrão 149, a nossa passagem pela guerra em Angola deixou-nos mais conscientes, melhor preparados, mais maduros e mais fortes para enfrentar as agruras da vida prática diária no futuro.
De certo modo isso comprovou-se posteriormente na vida civil dos nossos Soldados Combatentes sem casos graves psico-traumáticos e com vidas civis bem sucedidas.

No seu mui-sucinto auto-perfil biográfico de Homem Militar conta-nos que;
     

A sua postura e comportamento Militar como 2º Sargento de Transmissões do Esquadrão Cav. 149 é contada, resumida e sistematizada de forma inapagável e indesmentível nos sucessivos louvores que lhe foram atribuídos pelo Comando do Esq. Cavª. 149, repetidos e consagrados pelas instâncias Militares Superiores, até à sua condição de herói de guerra condecorado.


Precisamente um mês depois do desembarque em Luanda e apenas doze dias depois da partida do Esquadrão do Ambriz com a missão; "Zala... se possível Nambuangongo" e já o nosso Sargento Leitão arquivava a (OS/4 - ECav.149, de 07Ago61) Ordem de Serviço 4 de 07 de Agosto de 1961 ditada pelo Cap. Cav. Rui Coelho Abrantes Comandante do Esquadrão.
Está ao lado do Tenente Médido Dr. João Alves Pimenta, do Alferes José Manuel Júdice Pontes e do seu grande amigo 2ºSargento Manuel de Sousa nosso primeiro morto tombado na picada em combate cujos primeiros louvores constam na mesma Ordem de Serviço. 


Tínhamos acabado de mudar das Mabubas para o novo aquartelamento do Caxito (04.11.1961) e o nosso Sargento Leitão era agraciado com novo louvor pelo Comando do Esquadrão 149 pelo seu desempenho nas Transmissões durante a Operação Viriato, tomada de Nambuangongo.  




E em 19 de Maio de 1962 o Comando do Sector 3 sediado na Fazenda Tentativa Louva pela 3ª vez o nosso Sargento Leitão cujo Louvor é subscrito pelo Comando do Esquadrão Cap. Abrantes em 29 de Maio de 1962.


 

Neste documento compilado pelo Sargento Leitão no seu "Diário de Guerra" em Santarém 20 de Setembro de 2005 (44 anos depois), o Comandante do Esq. 149 Cap. Abrantes reconhece o alto prestígio alcançado até 12 de Março de 1962 pelo nosso 2º Sargento Leitão junto do Comando do Sector 3 (comando da ZIN - Zona de Intervenção Norte).

 

Por Portaria do Governo da República de 29 de Novembro de 1962 o Ministro do Exército Louva o nosso 2º Sargento Leitão do Esq. Cav.ª 149 pelo seu desempenho em todas as Operações que tomara parte activa mesmo em "missões estranhas ao seu serviço".
O Comando do Esq. 149 confirma e publica esta Portaria na OS/6-QG/RMA de 18Jan63.



Todo este percurso preencheu uma brilhante "Folha de Serviços", correspondente a uma carreira Militar exemplar e única e, inevitavelmente, elevou o Nosso 2º Sargento Leitão à gloria de Herói de Portugal.
Merecidamente.


2º SARGENTO LEITÃO FOTÓGRAFO

Paralelamente e sem beliscar em nada a dedicação à sua vida militar o 2º Sargento Leitão desde a primeira hora de mobilizado deu vida prática a uma sua velha inclinação natural para a fotografia como repórter amador.
Amador como 2ª ocupação que não em qualidades naturais e sobretudo em bom gosto fotográfico para realizar um trabalho notável de repórter de imagem durante toda a Comissão de Serviço  do Esq. 149 em Angola.
Sempre equipado e acompanhado da sua Rolex percorreu as picadas do mato e instalou uma Câmara Escura em todos os locais de acampamento para poder produzir as fotografias que são hoje um dos maiores acervos fotográficos daquele tempo de guerra em Angola.
O seu entusiasmo era tanto que pedia ao Cap. Abrantes para participar em Operações militares de elevado risco de vida, sem que nada o obrigasse a isso, apenas guiado pela ideia valorosa de registar a história daqueles tempos e captar num momento-instante especial que pudesse acontecer a dor e violência da guerra.
Nenhum repórter profissional teria feito melhor e com mais sensibilidade como o fez o engenhoso e meticuloso 2º Sargento Leitão Artista de Transmissões e Imagem como fotógrafo oficioso do Esq. Cav.ªa 149 entre 1961 e 1963 em Angola.

DE ALCÂNTARA, LISBOA ATÉ "ZALA... TALVEZ NAMBUANGONGO"

          PREPARAÇÃO, TAPADA DE MAFRA



EMBARQUE EM ALCÂNTARA, LISBOA 1


EMBARQUE EM ALCÂNTARA, LISBOA 2 




EMBARQUE EM ALCÂNTARA, LISBOA 3


EMBARQUE EM ALCÂNTARA, LISBOA 4 


 
EMBARQUE EM ALCÂNTARA, LISBOA 5 


 EMBARQUE EM ALCÂNTARA, LISBOA 6




DESEMBARQUE EM LUANDA E NOS DRAGÕES





NA FAZENDA TENTATIVA 


DA TENTATIVA PARA O AMBRIZ

ARRANCADA DE AMBRIZ PARA ''ZALA... TALVEZ NAMBUANGONGO''

28 MESES DEPOIS DE LUANDA ATÉ ALCÂNTARA, LISBOA, RC7






SER OU NÃO SER UM BOM MILITAR

Em princípios de 1961 o Comandante do Grupo Divisionário de Carros de Combate de Stª. Margarida chamou-me ao seu gabinete para me informar acerca de um louvor que me dera e ia sair na Ordem de Serviço do dia seguinte por ter sido o 1º do curso de Carros de Combate M47 e desse modo, disse, me limpar a Caderneta de 5 dias de Detenção que me havia dado 15 dias antes.
E, voltando-se para mim disse: - Você é o militar como eu gosto pois um bom militar tem de ter louvores e castigos -.
Na altura não lhe respondi nada pois quinze dias antes aquando dos 5 dias de detenção lhe disse que o tinham enganado e não era eu que devia ser castigado exaltou-se e pôs-me imediatamente fora do gabinete.
Mas agora posso dizer-lhe aqui que pode ter algum sentido prático o que ele considerava ser um bom militar. Faz aparentemente sentido contudo em qualquer uma das duas situações o militar subordinado louvado & castigado teve sempre razão nos dois casos e da parte do superior militar julgador houve sempre um erro de apreciação em uma das duas situações.
A razão estava do meu lado, quer quando fui castigado quer quando fui louvado; o Comandante do GDCC se Stª. Margarida é que se deixara enganar levado por aparências e relatos falsos.
Também com o Major Rui Abrantes se deu algo semelhante; Ele que como Comandante do Esq. 149 fora condecorado e feito herói nacional, mais tarde como Major Comandante das Tropas em Macau, acabou sendo expulso do Exército por efeito de, como Militar, se recusar a fazer papel de político.
Portanto aquele sentido expresso pelo meu Comandante em Stª. Margarida não passa de uma falácia da gíria de caserna que não corresponde à verdade do que é ser um Bom Militar.
Tanto o Comandante Abrantes foi sempre um grande e Bom Militar altamente considerado e correspondido pelos seus subordinados sem hesitação alguma, tal como eu, à minha reduzida escala de Furr. Miliciano, antes como Aluno da Escola de Sargentos Milicianos e depois como Furriel em Angola senti e tive sempre o respeito e o apoio decidido e dedicado quer dos camaradas de estudo quer dos homens da minha Secção.

Vem isto a propósito do que é ser ou não um Bom Militar. 
Pois o 2º Sargento Leitão é o exemplo prático máximo do que verdadeiramente é ser um Bom Militar. Foi tão Bom Militar e tão particularmente um Militar Exemplar que desde Soldado Recruta até ao posto de Capitão foram anos e anos de tarimba e carreira feita a pulso usando sempre e apenas as suas capacidades de inteligência e qualidades militares e humanas de um Homem integro que teve sempre razão por mérito próprio.
Não deu sequer nunca qualquer hipótese ao erro de julgamento para ser depois compensado como moeda de troca pelos erros cometidos por maus juízes militares.  
Não era do tipo "antes quebrar que torcer" mas antes daquele tipo em que os trabalhos e os casos se resolvem diligente e inteligentemente antes de atingirem qualquer ponto de rotura para quebrar ou torcer.
O seu grande Recurso Pessoal e Militar era puxar pela cabeça e Resolver.
Quando resolver, tal não era possível, informava sem falhas o que era necessário para poder Resolver. 
E Resolvia.
Partiu de Soldado Raso e chegou a Capitão, se tivesse partido de Alferes por via académica teria chegado a General quaisquer que fossem as circunstâncias. 


CAPITÃO AVELINO JOSÉ LEITÃO 
1931 - 2018





quinta-feira, 14 de maio de 2020

CARTA DO CAP. RUI ABRANTES EM LUANDA PARA ALFERES RUBEN E LIDA AOS MILITARES DO ESQ. CAV. 149 EM QUIPEDRO EM 30.08.1961

O 2º Sargento Leitão comandante do Serviço de Trasmissões e Cifra do Esq. transcreveu esta carta e arquivou-a até 2005 (44 anos depois), data em que iniciou a organização de um Caderno Comentado titulado "Diário de Guerra" do qual esta carta constitui um excerto.
Quando em 27/09/2005 enviou ao Furriel Contreiras também do Esq.149 um pacote de quase uma arroba de fotografias também lá vinha esta carta importante como documento de prova da permanente dedicação e preocupação com o bem estar e cuidar de obter o melhor para o Esq. 149, sua Unidade.
Sua porque feita e conduzida à imagem do seu carácter e visão militar invulgar os Soldados reconhecidos lhe correspondiam e obedeciam valorosamente sem hesitações e de vontade própria.



sexta-feira, 8 de maio de 2020

EQUIPAS DE FUTEBOL DO ESQ. 149 E OS GRANDES JOGOS


JOGO TREINO NO CAMPO DO CAXITO 1961
 
JOGO NO CAXITO 1961
De pé da esquerda para a dirira: Soldado José Augusto, Alferes Agostinho Ribeiro, Furriel Carita, 
Alferes Ribeiro de Carvallho, Soldado Aníbal, Soldado Camilo.
Sentados da esq. para a direita: Cabo Cardona, Cabo Fernando, Soldado Leal, Furriel Contreiras e Furriel Leite.
JOGO NO CAMPO DO CAXITO 1961
JOGO CONTRA O ESQ. 107 NO CAXITO 1962
JOGO CONTRA A EQUIPA DA COMPª. DE ENGª. 123 EM LUANDA 1962
AS DUAS EQUIPAS DO JOGO COM A COMPª. ENGª 123 EM LUANDA 1962
JOGO COM O ESQ. CAVª. 122 EM LUANDA ESTÁDIO DOS COQUEIROS 1963

Constata-se que a maior parte eram craques insubstituíveis na equipa base do Esq. 149; eles estão em todos os jogos como o Soldado José Augusto de Lx, o Cabo Fernando de Linda a Pastora, o Soldado Camilo de Catanhede todos ex-jogadores júniores do Benfica e o Soldado Anbíbal ex-júnior do F.C.Porto, além dos igualmente insubstituíveis Alferes Ruben, Furrieis Contreiras e Carita e do Soldado Leal da Covilhã e mesmo os poucos restantes são regularmente os mesmos como o Alferes Ribeiro Agostinho Comandante do 1º Pelotão.
Havia, portanto, uma equipa de seleccionados pelas melhores artes do chuto, domínio e passe de bola e portanto formavam o grupo dos indiscutíveis.
Indiscutíveis? Bem com o Alferes Ruben não se podia discutir muito pois ele era o 2º. Comandante do Esq. e se ele queria jogar não era fácil excluí-lo da equipa tanto mais que, diga-se, qualquer outro seu subtituto não faria melhor que ele.

Também de realçar, deste tempo de guerra, que estes jogos só foram possíveis porque estávamos sediados no Caxito como Unidade à ordem e sob o comando especial do Sector 3, Comando Geral Militar da ZIN, Zona de Intervenção Norte instalado na Fazenda Tentativa.
Quando mais tarde mudámos para o Mucondo isolados do mundo e rodeados do inimigo por todos os lados tais exercícios de recreio terminaram.
A receita do Dr. Pimenta, para aliviar o duro isolamento sob constante perigo, era enviar os mais desorientados física e mentalmente uns dias para Luanda de modo a refrescar-lhes a mente e elevar-lhes o moral.
E o Dr. Pimenta era um grande médico e um psicólogo gentleman expert atento ao mínimo sinal de desvario mental dos Soldados.
    
 

quinta-feira, 7 de maio de 2020

TEMPOS DE PANDEMIA: A "GUERRA" AO VÍRUS E A GUERRA MESMO.


 DISTRIBUIÇÃO DO CORREIO

«Este período de confinamento, longe de estimular a solidariedade, tornou-nos mais rudes, agressivos e egoístas.» 

Esta frase, como se constata, é pensada em relação ao problema da pandemia da actualidade e foi publicada num texto do Blog "Ponte Europa" de autoria de Carlos Esperança. Este autor que costumo ler embora não assiduamente no seu Blog referido foi combatente na Guerra Colonial e quando fala dessa sua experiência não poupa nas palavras contra a desgraça motivada e estimulada pela guerra. Maldiz da guerra mas fala de experiência própria e fundamenta racionalmente a sua inimizade à guerra que, aliás, tal malquerer é comum a todos que a viveram na pele e no osso.
Mas esta frase, talvez pela comparação generalizada na fala corrente entre o combate na guerra e o combate ao vírus, fez-me lembrar imediatamente a guerra por onde andámos nós todos submetidos.
E sobretudo por ter bem presente na memória 149 o célebre discurso do Dr. Alves Pimenta, nosso mui estimado merecidamente médico do Esq. Cav.149, no qual ele refere mui explicita e precisamente o contrário da ideia de que a guerra nos tornou "mais rudes, agressivos e egoístas".
Ao contrário, diz o Dr. Pimenta, a nossa participação na guerra e combates sob perigo de vida ou morte vividos em comunidade isolada no interior das matas e picadas angolanas, tornou-nos mais compreensivos e sábios para enfrentar situações complexas de resistência perante a dureza da luta diária pela sobrevivência ao longo da vida civil corrente. E também, segundo o Dr. Pimenta, tornou ainda melhores todos os Soldados de bom carácter e menos agressivos e rudes os mais primários e analfabetos oriundos de Aldeias profundas escondidas nas serras.
E, claro, vivendo assim isolada e diariamente numa comunidade pequena de Esquadrão, ou Companhia, a entreajuda e amizade criada na luta de todos pela sobrevivência comum e de cada um torna obrigatório e evidente que o egoísmo individual quase desapareca no momento e perdurará na memória como força de contenção egoísta pela vida fora.
A guerra mata e o vírus também mas deste precisamos ser vacinados anualmente enquanto a guerra foi uma vacina para a vida toda; ninguém mais quer e evitará conscientemente voltar novamente à guerra com armas  de morte na mão. 

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A distribuição do correio
era a festa do acampamento.
O grande momento
ansiosamente aguardado, também com algum receio
das notícias boas ou más que vinham no envelope
que mal era recebido pelos Soldados se afastavam,
isolando-se, com as cartas na mão que abriam.
E liam ávidamente, de enfiada, d'um golpe,
vendo-se claramente do que as cartas lhes falavam
porque enquanto uns ficavam contentes e sorriam
outros ficavam preocupados de rosto pesado e sério.
E outros, que liam e reliam as doces palavras da amada,
entusiasmados, atiravam-se sobre a manta estendida
no chão, que era a sua cama sempre feita,
ajeitando-se como quem com uma mulher se deita
ou como se estivesse alguma ali deitada
meiga e sorridente, aberta e pronta, toda oferecida
ao furor
desse doce e indecifrável mistério
que permite a dois amantes fazer amor
mesmo, como neste caso, afastados meio hemisfério.

No dia seguinte de manhã não houve alvoroço,
todos ficaram até mais tarde na manta-cama
descarregando intensamente os sonhos e desejo moço
à terra, ao céu ou àqueles a quem se ama
e tinham enviado boas notícias recentes
que lhes mantinham as almas ainda quentes
ou em brasa, conforme os casos,
levando a que, dos Oficiais aos Soldados rasos,
respondessem logo
apagando a labaredas do aceso fogo
sobre o corpo aberto dum extenso aerograma.
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Excerto do poema "O Correio" do livro "Esquadrão 149, Os Trabalhos e os Dias" de José Neves.